terça-feira, 30 de dezembro de 2008

É tudo nosso!

Era uma vez a história de duas bailarinas. Sem muitas explicações, a vida fez o favor de apresentá-las ao público e a si mesmas. Entre coques, meia calças e esparadrapos, as duas conheciam-se, despretenciosamente, como muita coisa nessa idade. Eram então muito novas para dimensionar as conseqüências que iria trazer o tal favor da vida, o que fica claro quando dizemos que ambas pertenciam à "turma das pequenas". Provas de roupas, exames com o temível professor João, alongamentos e macaquices na barra de exercícios, mães frenéticas carregando fantasias, bailarinas com anseios macrocósmicos ou jogadas ali de pára-quedas... E em meio a tudo isso, as duas. O convívio entre as bailarinas durou exatos 3 espetáculos. Depois de algum tempo, uma resolveu trocar a academia de dança por aulas de inglês e da outra nunca mais soube.
Alguns anos se passaram e a vida mais uma vez resolveu não mais deixar longe o que deveria estar perto. Por um feliz acaso, se é que ele existe, um tal site de relacionamentos fez com que as bailarinas, agora já um tanto quanto fora de forma e algumas medidas aumentadas, se redescobrissem. O termo é proposital: a falta de pretenção passada reservou surpresas para o futuro. E foram tantas surpresas boas! As meninas haviam crescido e estavam descobrindo que havia muito mais coisas em comum do que meramente os calos e sapatilhas. Era ano de vestibular e com ele as aflições, o medo e a ralação. Noites mal dormidas, anemia e meninas um tanto quanto "verdes". Mas apesar de um ano do cão, ele foi intercalado e compartilhado por algumas tantas alegrias e batidas no Lelo's. Tornaram-se tão companheiras que quando uma não mais teve companhia para tal passeio, a outra logo juntou-se a ela. Sem muita aprovação matriarcal, as duas tornaram-se as solteironas da vez. Largaram o álcool misturado ao leite com fruta e partiram para os filmes atolados em pipocas e refrigerantes, sem esquecer é claro das infinitas confabulações. Ah, as confabulações! Passariam o resto da vida praticando incansavelmente a tarefa que é tão inerente à presença das duas. Flui tão naturalmente leve quanto a vida que aprenderam a viver. Não é preciso esforço para que os assuntos saltem das bocas, os ouvidos assimilem e os olhos compreendam. E menos esforço é necessário quando a fala demonstra-se desnecessária. As bailarinas aperfeiçoaram a capacidade de se entenderem através da linguagem não-verbal.
Dizem que a sorte não bate duas vezes no mesmo lugar, mas talvez ela tenha mesmo decidido que essa amizade devia florescer. Imaginando as tais meninas sozinhas, fica difícil saber o que teria sido delas. Juntas, aprenderam a dividir o peso dos problemas, o desejo de saírem do casulo, a vontade de terem asas, os planos para quando as tiverem, a vida leve, o vôo livre, a fluidez (...) Não há como relacionar tudo o que foi partilhado se não dissermos: dividiram uma parte da vida! E não qualquer parte dela. É uma parte importante, grandiosa, embebida em infinitas possibilidades. A essa parte da vida costumamos chamar presente. A junção perfeita entre tempo e agrado. De fato, o tempo é agradável enquanto a música soa e os pés deslizam. Pés que logo contagiam todo o corpo, em sintonia com a música que toca e em pouco tempo o salão pertence a elas.
Talvez comecemos a perceber o quanto as pessoas são importantes quando imaginamos a vida sem elas. O meu salão com certeza fica muito vazio, meus pés não têm força para equilibrarem-se sobre as sapatilhas, a música ganha ruídos e a dança não flui. Enquanto os dedos tentam escrever algo que diga mais ou menos o quanto a bailarina é importante para o espetáculo da minha vida, o rádio toca POLLERAPANTALÓN. E como boa dançarina que é, você sabe que desperdiçar tal canção é imperdoável. Portanto, apenas peço: fique! Esse é apenas o primeiro ato dos muitos outros que virão. Obrigada, infinitamente. E agora, solta o som, chica!


o dono da foto:

Balanço I

Antes parecia muito mais fácil fazer aquele "balanço de fim de ano". A vida parecia resumir-se a alguns pontos, que reuniam alguns acontecimentos mais marcantes e ponto, estava fechado. Não muito além, o resultado de tal fechamento era positivo ou negativo, dependendo da predominância dos fatos.
Pois bem, neste ano o balanço mudou de face. O tal descobriu a complexidade que envolve a vida, mas o quão simples ambas podem ser. Sim, viver é complexo. A começar pelos questionamentos básicos que não se cansam de querer descobrir de onde viemos e para onde vamos. E talvez por não vermos tais respostas, vamos aprofundando cada vez mais o baú de perguntas que descobrimos no porão. Sobre as respostas, confesso não saber. Talvez elas sejam de competência individual, cada qual a seu tempo e de sua forma. Mas quanto as perguntas, me arrisco: são motores que nos impulsionam. Fazê-las ou não pode implicar ir adiante ou voltar pelo caminho.
Antes, talvez eu tivesse o anseio infantil de querer ver todas elas respondidas. Como criança curiosa, as respostas ganhavam maiores proporções do que as perguntas. Mas com o passar do tempo, aprende-se que nem todas devem ser respondidas com a prontidão de uma certeza. Algumas necessitam de tempo para serem construídas e compreendidas de forma mais proveitosa. O responder vai além: significa viver, ir adiante, experimentar, perceber que há diversas maneiras e optar. Responder exije da vida, enquanto perguntar exije de nós mesmos. É uma troca que deve ser feita sem afobação ou anseios de brevidade. É preciso calma para perceber quais perguntas devem ser respondidas e quais respostas devem ser dadas.
Dessa forma parece que as coisas ganham ares mais leves. Deixam fora da bagagem o peso da obrigação, assim como a rapidez que o mundo insiste em nos cobrar. Fica assim, fluindo, com a naturalidade das coisas que por si só encontram seus lugares, sem desespero. Quando a avó dizia que ''no fim tudo se ajeita'', pode ser que ela não tivesse razão ao dizer ''TUDO''. Mas quando conciliamos tal frase com o conselho de "dar tempo ao tempo", é quando percebemos que as coisas podem ajeitar-se.
E assim a vida tem caminhado. Fluindo leve, buscando ver mais claro, sem excessos, mas vontades à vontade. Se puder pedir algo a 2009, que seja isso: VONTADES, encontrem espaço para fluírem, descobrirem o mundo, saírem da bolha e perceberem o quanto a vida pode ser colorida.
Quanto ao balanço, esse é só o princípio. Não dá mais para querer resumir a vida, nem encerrarmos tudo com a simplicidade de um ''positivo/negativo''. É hora de ver como ela fica do tamanho de si mesma.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Sem limites


É difícil escapar ao clima que envolve os finais. Seja lá qual fôr, o término de algo tem características quase que inerentes. Aquela sensação de ''acabou'' cai sobre nós e a partir daí, salve-se quem puder. É a partir desse estopim que as conseqüências engolem qualquer tentativa de controle. As rédeas perdem-se em meio aos galopes e o turbilhão tem início.
Não há regra. Os finais podem ser felizes, trazerem gostos amargos, talvez nostálgicos, ou quem sabe ainda a sensação de que apenas mais um ciclo encontrou seu fim e logo menos encontrará seu recomeço natural. O fato é que alguns finais envolvem perdas e perder não é doce. Perder traz sensação de mãos vazias, peito apertado, finitude, o que pertencia (se é que algo nos pertence de fato) não pertence mais.
Aqui, lidar com perdas nunca foi tarefa fácil. Encarar que elas existem e acontecem a todo e qualquer momento, sem que estejamos necessariamente preparados, exije. Tudo pode acontecer muito rapidamente. O mundo caminha a passos largos. Ver virar a esquina aquilo que tanto quis reter nas mãos... Parece impotência, mas se confunde em meio a quantidade do que sentir. Gostar, querer próximo, gostar, deixar livre, gostar e entender que pertence ao mundo. Pertence a ele porque é muito grande! Tão grandioso que não cabe apenas em si mesmo, muito menos em apenas um coração. Tem um mundo de desejos, vontades e anseios; mas tem um universo de chances para realizar-se. É assim... deixar livre para ver florescer, ir longe, muito longe.
Talvez esse seja o fim encontrando o começo. Um novo ciclo inicia-se e vai seguir seu caminho. Quem quiser que o acompanhe. Mas saiba que não há limites...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

"Sofre mais quem espera sempre
ou quem nunca esperou ninguém?"
p. 62

"Não será nossa vida um túnel
entre duas vagas claridades?
Ou será uma claridade
entre dois triângulos escuros?

Ou não será a vida um peixe
treinado para ser pássaro?
A morte virá de não ser
ou de substâncias perigosas?"
p. 35

Pablo Neruda, Livro das Perguntas