terça-feira, 22 de dezembro de 2009

22 de dezembro de 2009

A única coisa que não posso esquecer é que amar não significa abandonarmos as pessoas só porque elas querem uma vida diferente da que levamos. Muito menos as privamos de viver...

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

8 de dezembro de 2009

É aquilo que já não tem mais nome, mas conserva ainda a mesma intensidade da dor. Espalmo o chão três vezes e peço arrego da luta. Não é o meu corpo, mas cada parte da minha alma clamando por um pouco de descanso e felicidade. Antes que todas elas comecem a crer que isso não passa de lenda.

domingo, 6 de dezembro de 2009

6 de dezembro de 2009

" _Você ficaria sentida se eu fosse? - perguntou à moça de óculos, que lamentava cada minuto passado longe dele, mas que não sabia lhe recusar nada." (A insustentável leveza do ser - Milan Kundera)

Meu mais novo livro de cabeceira. Ou melhor, da vida.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

4 de dezembro de 2009

Sentiu-se feliz ao imaginar que dentro da caverna evitaria ao menos nutrir expectativas sobre os seres humanos.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

2 de dezembro de 2009

O peito se enche de vontade de fugir pra longe, sem que nada nem ninguém o acompanhe. Pede um retiro espiritual para se refazer. O tempo para respirar tem se tornado curto demais novamente, e o esforço que isso pede torna tudo exaustivo demais. Ouço o eco da caverna chegando até mim e gritando meu nome. Pede que eu faça companhia às rochas, uma vez que estou prestes a me tornar uma. Hoje o corpo ainda arde em febre, mas algo em mim sente que em breve o calor se esvairá e vão restar apenas marcas minhas incrustradas no chão.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

26 de novembro de 2009

O cérebro tem andado tão exausto que só tem pedido arrego. O corpo se conduz por inércia e só encontraria o verdadeiro repouso no colo de quem faz tanta falta. Ambos clamam para que o tempo passe logo e tudo possa voltar ao normal novamente. Carinho, preguiça de acordar, vontade de não dormir, tempo para aproveitar, abraços, abraços, abraços, conversas deliciosas no aconchego, um tempo infinito que passa tão rápido, mas não desiste de ser pra sempre. Vem logo e prometa que não vai mais embora!

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

20 de novembro de 2009

Admiro as pessoas corajosas. Aquelas que encaram as adversidades como se elas sequer existissem, mesmo vendo todas as paredes tornarem-se pó. Pois então, quando você for apenas perguntas, pergunte-as ao pó.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

17 de novembro de 2009

No fim das contas, é exatamente isso. Acostumamo-nos com o cardápio de sempre, engolindo a seco e desnutrindo a esperança de que tudo mude. A tal rotina das coisas, onde cada uma delas passa a ser, lá no fundo, esperada por cada parte do nosso corpo. A mente certamente não descansará, enquanto o coração bate devagarinho, como quem pede arrego. Talvez peça, embora poucos ouçam sua voz já rouca de tanto gritar.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

12 de novembro de 2009

Era tanta coisa para ser dita que, com medo de que as palavras atropelassem a ordem considerável das coisas, resolveu guardá-las como de costume, naquela mesma caixa empoeirada de sempre.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

5 de novembro de 2009

Lembrou das palavras da mãe sempre tão presentes quando o assunto era problema: "vocês tem uma vida tão boa, mas ainda assim insitem em reclamar tanto... não sabem o que é um problema de verdade". Ao contrário do que sempre havia pensado, dessa vez concordou. Era uma dramática por natureza, repleta de buracos no coração que ela mesma havia cavado. Sabia que lá no fundo suas dores e amarguras eram muito maiores em sua cabeça do que a realidade apontava. Não lembra ao certo quando o hábito começou, mas sabe que otimismo nunca foi a palavra de ordem da sua vida. Sempre questionando, sempre duvidando, sempre tão cheias de expectativas para as quais desejava apenas um fim: a frustração. Talvez um pouco masoquista-melodramática, chorava mas gostava da ardência e das noites de sono perdido. Até o dia em que a vida resolveu apertar contra a parede e mandou decidir entre ir ou rachar. E então entendeu como funcionava verdadeiramente o exercício de desapego. Abriu portas, armários, gavetas e o coração, recheou sacolas e páginas daquilo que sobrava, num ciclo de acúmulo que nem mais se percebia. Ao fim, tudo limpo, somente o essencial e um mundo a menos nas costas. Apertou os olhos bem forte e desejou que aquela sensação permanecesse para sempre. Será dessa vez?

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Décimo nono desabamento

Qual era mesmo o nome disso, ou daquilo? Aquilo que te infla, como um balão daqueles infantis, coloridos, cheio de pompa lá no alto do céu, e que depois murcha como uma flor esquecida há séculos. Aquilo que te causa as melhores sensações do universo, torna seus dias mais róseos, tudo numa suavidade majestosa, numa brisa leve, muito leve, e que depois faz o ar rarefeito, o coração bater acelerado, mas não é de ansiedade, causa dificuldade para respirar e a dor de um nocaute. Aquilo que estimula os planos e as vontades mais gostosas, por vezes nunca sequer imaginadas por nossa mente e nosso corpo, e que depois desmorona como um castelo de areia, implodido.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Décimo oitavo desabamento

Coisas e dias realmente inexplicáveis. Vai ver alguma coisa sempre precise estar fora do lugar mesmo... Mais alguns parênteses ocos e aspas vazias quando as linhas deveriam ser infinitas e grandiosamente prolongadas.
Vai ver certas coisas não tem lugar mesmo...

domingo, 4 de outubro de 2009

Décimo sétimo desabamento

Se eu pedisse arrego e confessasse o quanto meu coração está estraçalhado? Se eu gritasse que minha cabeça dói e eu já não consigo mais pensar? Se eu chorasse as lágrimas de vidro que ninguém vê enquanto me escondo? Se eu pedisse pra dormir, eternamente, cansada de tudo?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Décimo sexto desabamento

Aqueles que vivem, bem sabem que há dias e dias. Há inclusive um famoso ditado popular que diz "um dia da caça, outro do caçador". Grande sabedoria dos povos. Provavelmente em quase todas as culturas deve haver ditados que expressem isso.
Às vezes, logo que acordo, fico brincando de tentar prever como será o decorrer do dia e aquilo que vai encerrá-lo, com chave de ouro ou não. Alguns são possíveis: já começam tortos, com telefone tocando e ninguém para atender, celular que despertou há séculos e você desligou sem perceber que já está uma hora atrasada, aspirador de pó passeando pela casa, cachorro da vizinha latindo, passarinho cantando em stress maior... É, tem dia que dá para prever. Outros, entretanto, começam com contornos tão sutis, com aquela brisa marota entrando pela janela e despertando com aconchego, que parece impossível admitir seu trágico desenrolar. Bombardeios na sua cabeça quando só o que você queria era conseguir uma noite de sono tranquila. Que ultimamente, aliás, tem sido bem difícil.
Enfim, costumo encerrar o dia tentando convencer a mim mesma com as palavras mágicas: "foi só mais um dia ruim; amanhã passa!". E eu ainda acredito!

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Décimo quinto desabamento

Senti uma espécie de inveja da dor dela. Aquela que já foi motivo de algumas incertezas e certa antipatia, de uns tempos para cá, e cada vez mais, tem despertado uma boa dose de afeto. Talvez seja a cumplicidade, mesmo que tão timidamente guardada. Creio que você desconheça o fato de ambas entendermos a mesma situação, com a sutil diferença de perspectivas. Talvez você não soubesse e caiu de cabeça, abriu os braços e o coração todo. E agora sofre, infelizmente. Sinto, divida em duas. De um lado o amor que tem vontade de atracar em algum porto seguro e não sentir muito mais do que marolas aconchegantes; do outro, asas como a de um beija-flor, frenéticas, ansiosas para voar adiante e não permanecer mais do que o necessário para suprir suas necessidades, mesmo parecendo no fim das contas nada mais que vontades. Olhando atentamente, creio que posso dizer ter tido sorte. Nunca houve algemas e a intenção de não tê-las era muito clara. Talvez o mais próximo que pude chegar daquilo que muitos chamam de "amor livre". Embora não saiba com certeza se era amor. Provavelmente algo mais próximo de paixão e desejo. Tinha uma forma dócil, embora arisca, que encantava facilmente, numa fluidez quase imperceptível. E é provável que as encrencas onde seu coração se meteu tenham vindo justamente daí, do imperceptível.
Caríssima, manifesto aqui minha afetividade gratuita e minha admiração discreta. Boa sorte com os ferimentos que as unhas afiadas causaram. É a característica quase primordial dessa espécie. Felinos...

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Décimo quarto desabamento

Odeio odiar você, mas hoje eu odeio e agora meu sangue fervilha.
Nem o sono dá trégua...

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Décimo terceiro desabamento

O sono sempre se esvai nas horas mais impróprias e a mente dispara sempre que o corpo pede arrego.
Odeio odiar você, mas parece sempre mais forte que eu.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Como, por Marcela Marx

Às vezes me pergunto como foi que cheguei até aqui,
quando dei por mim o cachorro já havia morrido,
as crianças me cumprimentavam olhando para baixo,
a grande árvore em frente de casa havia sido cortada.
Às vezes me pergunto como foi que cheguei até aqui
quando olho para meu antigo quarto e vejo as prateleiras vazias,
a trepadeira que cobriu toda a parede do muro
e agora não enxergo mais a janela do vizinho.
Às vezes me pergunto como foi que cheguei até aqui,
quando me deparo com um anel na mão esquerda de minha amiga,
me assusto com as rugas no rosto de minha mãe
e vejo a pilha de livros de minha mesa aumentando.
Às vezes me pergunto como foi que cheguei até aqui,
quando acordo e, da cama, vejo a geladeira,
a hora que cheguei em casa do trabalho
e meu avô, que não colhe mais laranjas.
Às vezes me pergunto como foi que cheguei até aqui,
sem saber como.
E me dou conta de que é caminho sem volta.

Vem daqui, ó!





Décimo segundo desabamento

Prefiro ser a pior cega, aquela que não vê as coisas que estão ali, latejando na sua frente. Minhas lentes estão em cacos...

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Décimo segundo desabamento

Quando somos pequeninos, as resoluções dos problemas da vida são de uma simplicidade estonteante. Digamos que os problemas já não são em número elevado, embora existam e a gente bem sabe. Aquela briga entre primos por causa do brinquedo mais querido, a discórdia que sempre acabava em choro por causa do brócolis que a mãe insistia em colocar no prato e dizer ser tão gostoso quanto batata frita, a raiva que os meninos sentiam das meninas e vice-versa, amaldiçoando um ao outro e jurando nunca fazer aquilo que a mãe ou o pai fizeram, como beijinhos, abraços apaixonados e etc. E então o corpo vai ganhando forma, nós vamos crescendo, descobrindo tantas outras problemáticas e cada vez mais perdidos sobre como resolvê-las. Alguns conservam a leveza da infância para sempre, vendo os tais "problemas" como algo tão natural, semelhante a comer ou dormir. Eles são aquilo que animam nossa existência, nos tiram da inércia, nos tornam menos apáticos perante a vida e por ai vai... Essas pessoas são aquelas que parecem nunca envelhecer. As rugas são muito sutis, cabelos brancos quase nem se vê, e o bom humor parece dormir numa lata de formol. Outras pessoas, porém, aprendem pelo lado mais difícil. Carregam sempre a visão de que os problemas são aquilo que tiram a gente da rotina, e daí o problema. Dificilmente conseguem ver a vida de forma despretenciosa sem que antes encharquem tudo com o hábito do pessimismo. Só eles sabem o quanto carregam um peso extra que machuca, cansa e desanima. E mesmo que saibam disso, tem uma visão clara do quanto é difícil mudar um hábito. Então ganham rugas fundas, arrastam uma amargura que cada vez mais fica menos doce.. E isso sem falar nessa dor no peito que nunca passa. Ah, não passa...

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Décimo primeiro desabamento

E eu que sempre detestei manuais de sentimentos, desejei um para saber qual caminho seguir ou entender quais deles sentir.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Desabamento décimo

Sei que não tenho o direito de exigir nada além de tudo o que já possuo. Tenho certeza de que é muito mais do que pessoas um dia sonharão ter. Pessoas que passam a vida sonhando com aquilo que eu sequer me dou conta.
É impossível não sentir todo esse amor que existe e é real. Quase dá pra tocar... Mas tropeçando nos meus próprios passos, perco o equilíbrio e quase destruo nossa relíquia. Consigo me perder dentro de um mundo que é tão pequeno se comparado a tudo aquilo que existe: o meu. Vejo um turbilhão na minha vida com soluções mirabolantes, mas caio em mim e percebo que tudo acontece dentro da infinitude de um copo d'água. E então esse oco toma conta de mim e aperta ainda mais o peito. Lembro de você dormindo, tão sereno, como se estivéssemos eternamente protegidos dos perigos que assombram o lado de fora. Uma lágrima escorre sem saber se é de saudade ou pesar. Aperto o travesseiro e penso o quão cega alguém pode ser dentro do seu próprio copo com água. Medo dos perigos lá fora? Como, se quem mais colocou tudo em risco fui eu, que estive tão perto?
Ganhei palavras que jamais esperaria hoje, de gente que não passa a mão na cabeça, mas lembra que muita coisa acontece primeiro aqui. Vou procurar pela coragem que perdi em algum canto enquanto me arrastava pelas paredes. E depois tudo há de ficar leve, infinitamente leve, insustentavelmente leve...

Desabamento nono

Meu peito queria urrar de dor, mas só o que conseguiu foi chorar baixinho. Fico pensando e concluo que não há nada para fazer agora. A pele queima, a garganta arde, o corpo dorme e acorda moído, mas é só reflexo. Não sei quando nem como volta, mas novamente sei que como tola que sou ficarei esperando aqui, com as marcas e cicatrizes disfarçadas, as olheiras e as lágrimas contidas e escondendo todo o resto que denuncia a guerra.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Desabamento oitavo

Relutei em desejar tudo o que meu coração explodia em sentimentos. Quis ponderar e me convencer de que "não é bem assim". Mas começo a concluir de que as coisas são exatamente assim, quer queira ou não. Quis muito, mas às vezes é tanto querer e pouco poder que nos perdemos e terminamos a noite mandando tudo à merda. Mais algumas aspas vazias e alguns parênteses ocos.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Desabamento sétimo

É um lugar estranho. Por mais que minha memória racional saiba e reconheça quem são todos eles, a memória afetiva encontra um pouco de dificuldade. Fica tentando encontrar formas de aquecer o coração e lembrar de cada um deles. Parecem fantasmas deslizando pela casa, desde os corredores e salas amplas até os cantos repletos de detalhes. Nenhum ambiente os enquadra e faz disso um quadro que mexa bem lá no fundo, como tenho a impressão que um dia fez. Mal se falam, pouco se olham, muito correm. E o problema (ou não) é que o desejo de correr permanece como algo que não é condenável, mas necessário. Como ter mergulhado no mar de lama e ter necessidade de sentir o ar entrando pelos pulmões. Desejo um lugar para voltar e me sentir sempre uma parte dele. Não uma parte que se perde, uma parte desnecessária, mas uma das peças que, JUNTO das outras, sejam sempre imprescindíveis para fazerem do todo aquilo que a gente costuma chamar de "lar doce lar".

domingo, 23 de agosto de 2009

Desabamento sexto

aspas DEPOIS NOS FALAMOS aspas
reticências e os parênteses. (ocos)


Um dia eu aprendo ou troco o disco.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Desabamento quinto

Pulsações. Li tal palavra enquanto buscava personagens para contar vidas. Delinear quem é, o que pensa, criar enredo, histórias e um desfecho que cause satisfação. Tudo isso perdeu o sentido ao me deparar com "pulsações". Um livro que nasce da necessidade de extravasar, para aguentar a carga da vida. É preciso criar maneiras de aliviar o peso antes de padecer. Escrever talvez seja uma delas. Exige menos do que ouvidos atentos, conselhos, divãs, milagres... Eu e a matéria-prima: palavras. Não pede que façam sentido à humanidade, mas são essenciais para a minha própria humanidade, aquela que vive em mim. Vive ou sobrevive. Depois de algum tempo passamos a não dar tanta importância às opiniões alheias por um motivo único: jamais agradaríamos todas. Mas aceito um desafio maior: agradar a minha própria opinião. Por mais simples que pareça, a mim beira a maior das dificuldades. Inconstante, inconsistente, incoerente. Sou feita e desfeita cem vezes em um segundo. Gostaria de perdurar, mas acho que perderia o fluxo. E perder o fluxo certamente seria morrer vendo a vida passar, eu parada, inerte, enquanto o mundo corre, voa, salta.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Desabamento quarto

Queria ficar livre de tudo, de todos, das coisas mais insignificantes às mais monstruosas. Dizer adeus e partir para o desconhecido. Não o desconhecido de si mesma, além das fronteiras que o mapa mostrava ou dos horizontes que os olhos já viram. Queria o desconhecido de todos, aquele que o ser humano enquanto vivo pensa, imagina, discute, filosofa... mas que apenas conhece depois que se entrega. De corpo e alma, literalmente.

Desabamento terceiro

Olhou atentamente para o semáforo e por alguns instantes apenas existia a cor vermelha. Gritante, viva, contrastava com as nuvens cinzas ao fundo. As cores andavam meio apagadas desde aquele dia, e até o céu resolvera chorar incessantemente desde então. Ouvia vozes maldizendo o tempo ruim, que tornava as coisas mais difíceis, as roupas molhadas e o frio ainda maior. Mas era tão natural o derramar do céu. Se todos nós temos fraquezas e nos permitimos chorar, por que ele não? Era seu maior cúmplice naqueles dias que se arrastavam desastrados, levando mesmo que sem querer tantas coisas ao chão, até mesmo as lágrimas. Foi interrompida pelas buzinas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Desabamento segundo

Já não sabia mais o que fazer com tantos dias. Cada instante que passava trazia mais incerteza se aquele problema teria ou não solução. Sentia apenas que o ar estava ficando pesado, causando falta de ar e apertos no peito, ora de tristeza, ora de raiva. Queria ter coragem para despejar todas as palavras amargas que guardava na garganta, mas a dor seria imensa para eles. E assim sendo, todo o alívio causado pelo vômito não seria maior do que o gosto ruim na boca. Sem saber o que fazer, subiu no telhado de casa e dormiu sob os cuidados da lua.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Desabamento primeiro

De fato, há heranças que não vêm através de papéis ou documentos. São fincadas na alma e têm dúvidas se um dia serão esquecidas.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Sonhando acordada

"Comecei a folhear minha vida desde os primeiros anos partilhados com Claude. Levei para a vida ativa de adulta o método usado durante o período de espera da infância e que não havia me decepcionado, e adquiri o hábito de intercalar o desenrolar de meus dias com constantes e elaborados sonhos diurnos. Eles participam a tal ponto do meu equilíbrio que estou convencida, por exemplo, de que minha inaptidão para aprender a dirigir carros se deve a uma vontade instintiva de dedicar aos sonhos esses momentos tão perfeitamente apropriados que são os deslocamentos nos transportes em comum. Passivo, cativo, o corpo fica tão perfeitamente abandonado quanto durante o sono, enquanto reservamos à inconsistente representação de nós mesmos, com a qual o substituímos, uma posição quase sempre melhor, mais bem controlada do que nos sonhos noturnos. Aliás, quem, ao sair de um sonho ruim, nunca tentou prolongá-lo, para poder corrigir a impressão nefasta, com o happy end de um devaneio consciente ou semi-inconsciente? Todos aqueles que compartilham comigo essa tendência sabem o prazer que tiramos das janelas abertas, na altura do metrô de superfície, e que nos mostram sem pudor flashs de intimidade, das fachadas, com seu reverso secreto, ao longo das quais deslizamos quando atravessamos de carro uma cidadezinha do interior, das conversas entre nossos vizinhos no compartimento de um trem, nas quais nos intrometemos fingindo que estamos dormindo. Por mais breve que tenha sido a visão, por mais fragmentada que seja a percepção de nossos companheiros de viagem, uma minúscula porção de nós mesmos também é arrancada e, como essas câmeras de televisão indiscretas, que fingimos serem manipuladas por um operador invisível, continua penetrando no interior do apartamento parisiense, da casa do interior, da briga familiar no banco ao lado. O sonhador difrata sua vida. O mundo desenrola diante de seus olhos tantas imagens atraentes, ou perigosamente curiosas, que ele gostaria de refletir todas, e coloca-as em perspectiva, isto é, aprofunda-as e enriquece-as. Uma teatralização espontânea faz com que, em alguns segundos, ele vá morar naquele apartamento, naquela casa, mesmo que eles sejam o extremo oposto de seu gosto; "Faço parte da vida dessa família", ele gosta de imaginar, percorrido por um arrepio, se a discussão entre essa última revela valores dos quais ele sempre fugiu. De certo modo, os pais de uma criança sonhadora têm razão de temer que mais tarde ela não tenha personalidade, porque o que se entende geralmente por isso é "personalidade única", e, de fato, o sonhador prefere ser várias pessoas, viver várias vidas, muitas das quais têm a mesma consistência e a perenidade de um grão de poeira que uma corrente de ar deixou por acaso na entrada de uma casa. Por outro lado, estamos enganados ao acreditar que aquele que devaneia se afasta do mundo, pois quase sempre suas outras vidas o colocam, pelo contrário, em empatia com ele. (...) "

Trecho do livro "A outra vida de Catherine M.", de Catherine Millet (Ediouro, 2001)

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Retiro Espiritual


Vontade imensa de arrumar as mochilas mais leves e andar. Andar para longe, onde o vento sopre macio, como quem acaricia. Conhecer pessoas novas, sentir saudades das companhias antigas, encontrar novos lugares, respirar ares menos pesados, cortar os fios da banda larga e estreitar os laços de afeto. Acender uma fogueira onde não haja energia elétrica, cantarolar e dançar até que o cansaço tome o corpo ainda quente da euforia, ver o sol nascer e senti-lo tão perto. Desanuviar a cabeça e deixar os pensamentos fluírem livremente, sem censura, simplesmente puros. Voltar a ver as cores e não mais apenas os tons pastéis do cinza. Asfalto opressor, areia aconchegante. Sem prédios que ultrapassem dois andares, com janelas espaçosas, capazes de expor todo o horizonte que há adiante. No quintal, um cachorro serelepe e algumas roupas no varal. Cheiro de café fresco exalando da cozinha para todos os cômodos da casa. De manhã, aquela preguiça gostosa e permitida, inerente a todo dia que nasce além das montanhas. Logo ali o rio, o mar, a cachoeira... Respirar a natureza, exalar tranquilidade pelos poros. Dormir nos ombros, acordar nos pés, procurar os braços e o carinho. Ai, chega logo!


foto: http://bravonline.abril.com.br/conteudo/multimidia/invasao-russa-467205.shtml

UNIVERSO LÚDICO
Promenade, de Marc Chagall (1887-1985), representa o pintor e sua mulher, Bella. Fugindo do regime russo, ele foi para Paris. Sofreu novas influências, mas nunca abandonou as reminiscências da infância

sexta-feira, 5 de junho de 2009

DO CÃO


Quando ouviu a mãe abrir a porta do quarto com certa violência, soube que havia perdido a hora e que seu dia já começaria não muito bem. O mau humor estava estampado no rosto dela e agora era aguentar as consequências. Decidiu nem tomar café da manhã no intuito de não dar espaço para que a matriarca começasse a esbravejar logo nos primeiros 10 minutos de sua manhã, já quase hora do almoço. Arrumou a cama correndo, trocou de roupa e sentiu a pele toda arrepiada. Naquela semana, o frio foi companhia constante e fizera doer mais que o comum. Não conseguiu aquele calor necessário e congelou. Perdida em distrações, voltou à realidade fria daquele dia frio ao ouvir o barulho do aspirador de pó percorrendo os cômodos da casa. Dedicou-se a fazer o almoço, envolta em pensamentos que insistiam em pulsar, aquecendo-se minimamente em frente ao fogo azul. Almoçaram todos, mas não houve como fugir das palavras pesadas que martelariam durante o resto do dia. A comida entalou na garganta e só o que desabrochou foram lágrimas. Rolavam pelo rosto enquanto fazia o que ela tinha pedido. E rolaram mais ainda ao perceber que o pedido feito a ele não fora cumprido e que para ela isso não tinha problema. Tentar afastar o sentimento de raiva parecia impossível, otimizado pelos hormônios do mês que faziam tudo ficar à flor da pele. Precisava daquele outro ele, que durante o dia todo havia confortado minimamente na promessa de que mais tarde estaria lá para fazer o dia terminar mais suave do que começou. Mas esse definitivamente não era seu dia. Sentiu o golpe que fez arder, apertar o peito, deixar sem fôlego. As lágrimas não puderam ser contidas mais uma vez. Largou tudo como estava, quem sabe para amanhã, quem sabe com mais sorte. Agora era hora de encerrar o dia, não sem antes perguntar aos céus e todos os santos: "Onde foi parar a sensibilidade?"

domingo, 31 de maio de 2009

Segundo plano



O gosto amargo e dolorido do plano segundo...

sábado, 30 de maio de 2009

Bad trip

Dia meio assim, meio assado, e ela continua sozinha. Fazia mais ou menos uma semana que ela parecia não despertar verdadeiramente para o mundo. Ficava uma sensação de desconforto e cansaço desde o momento em que as pálpebras abriam até o momento em que elas se fechavam. Ultimamente o mundo lhe assustava. Em curtos períodos de tempo uma enxurrada de coisas tão amargas. "Quem foi que botou a chuva dentro dos meus olhos?", perguntava-se enquanto a música ecoava pela sala.
Os dias surpreendentes nem sempre dão dicas de que estão por vir. Foi assim... Prolongou todas aquelas sensações durante mais um dia, até a tarde fatídica. Tivera uma epifania tão envolta em sonhos, mas ao mesmo tempo tão nítida... A nitidez necessária para não saber distinguir entre sonho e real, se eram meras alucinações ou o que seria seu mundo para sempre. Era como se tivesse sido transportada para outra dimensão, idêntica à sua onde viveu por toda sua vida, porém onde nada era verdadeiro. O simulacro do mundo que pareceu sempre tão real e certo. Sua consciência brigava consigo mesma na tentativa de conseguir definir o que era mundo, o que era alucinação, o que era divino... Mas ainda havia ele ali. Uma das pessoas mais amadas da sua vida tomou formas que amedrontavam. Sentia como se a função dele fosse fazer-lhe companhia e despistá-la ao mesmo tempo, para que não houvesse chance dela escapar. Alice no país das maravilhas nunca fizera tanto sentido! Ele, o coelho; ela, Alice; o mundo, uma fumaça de alucinações nítidas e medo. Só conseguia imaginar quanta coisa deixou para fazer na realidade que sempre esteve em suas mãos e não soube aproveitar. Agora era uma prisioneira de um lugar onde nada era verdadeiro... Nem os sentimentos. O peito ficou apertado e a vontade de chorar era enorme! Mas algo impedia as lágrimas de correrem pelo rosto. Na mente, um turbilhão de pensamentos tão lógicos, num encadeamento que jamais pensara em alcançar. As associações faziam tanto sentido e era impressionante como nunca tinha pensado nisso antes! Mas interrompia as descobertas cada vez que imaginava ''isso não é real, eu não voltarei, dor, dor, dor". Não sabe dizer quanto tempo aquilo tudo durou... Parecia uma eternidade que o relógio não sabia acompanhar. Tentou dormir enquanto ele fora buscar algo para comer. Olhos abertos, olhos fechados... o turbilhão prosseguia.
Impossível dizer como essa história acabou, pois o fim ainda não chegou. Principalmente a clareza do que é verdadeiro ou falso....

pingado

Talvez um tanto quanto órfã

terça-feira, 19 de maio de 2009

E então...


Sentia um nó na garganta daqueles inexplicáveis. Nunca sentiu o peito tão apertado como agora estava. Repetia para si mesma como odiava surpresas e o quanto queria viver longe delas. Era mais fácil assim, planejando e tentando prever os acontecimentos. Mas daquele dia em diante a vida saiu dos eixos e a cada dia aparecia com uma novidade inesperada. Primeiro ele, depois a pancada. Acertou em cheio e ficou zunindo na cabeça pelo resto da vida. Conheceu mais um momento de epifania, como um flash que depois faz tudo voltar à escuridão novamente. Mas era um flash dolorido, daqueles que nos faz levar as mãos aos olhos, na tentativa de nos protegermos. Tão de repente, sem avisos, sem dicas. Sem caminho que levasse ao clímax da situação, caiu de para-quedas em meio ao desalento. Conheceu gostos amargos e sentiu como algumas coisas podem ser difíceis de descer garganta abaixo. Mas esforçou-se e desceram, já que sempre tivera o costume de engolir tanto as frutas quanto os caroços. Quis gritar, chorar até que o cansaço invadisse corpo e mente para fazê-la ao menos dormir, correr sem freio e sem destino, ir embora, ficar afastada, enterrar a cabeça na areia e não ver a cara do mundo durante muito tempo. Mas só o que conseguiu fazer foram algumas expressões incontidas de surpresa e dizer que tudo estava bem, enquanto sentia medo de vê-lo daquela forma em suas mãos. Trêmulo, transparecia um misto de tristeza e desespero. A cabeça dela girava transtornada, sem conseguir deixar nítida a linha entre sonho e realidade. Caminhou em torpor pelo resto da noite, como numa alucinação um tanto quanto real. A dor era de verdade... Sentia pontadas e aquele nó. Oscilava entre a respiração calma, até que qualquer coisa desencadeasse o ar pesado que entrava como aço nos pulmões. Cortou como faca e algumas provavelmente ficaram. A cada movimento algumas machucam mais ou menos, latejam e clamam para serem retiradas dali. Mas ela não sabe o quão fundo foram enterradas. É preciso calma e paciência para retirar todas e não deixar que nenhuma seja esquecida. Pediu aos céus qualquer ajuda que pudesse amenizar essa dor o mais cedo possível e deixou que o corpo afundasse em algum lugar do mundo.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Ela e as companhias

A música que soava ao fundo era melancólica com um tom de graciosidade. Algo como as marchinhas de carnaval repletas de melodias alegres mas com conteúdos pingados de lágrimas. Ouviu atentamente por alguns instantes e em seguida pediu ao garçom que lhe servisse mais uma dose. "Mas uma dose daquelas, sr. Antônio!". Sr Antônio era garçom daquele boteco há algumas décadas. Dizia que já havia visto de tudo por ali e orgulhava-se disso. Eram olhos que a terra provavelmente haveria de comer com gosto. Sr Antônio logo pegou a garrafa e despejou no copo daquela que ali estava na frente dele desde as quatro da tarde. Sabia que ela mal acharia o caminho de casa e que ele mais uma vez se atrasaria para chegar à sua. Ela não sabia ao certo como fora parar ali. Saiu da casa dele envolvida numa confusão entre o que era real e o que era devaneio. Acreditava que tinha ouvido ele falar que não queria mais, que era melhor parar por ali. Mas já havia dias que ela não dormia direito, sonâmbula, insone. A mente fervilhava, frenética. Tudo parecia muito rápido para um corpo que se arrastava devagar. Atravessando a rua, esperou que o semáforo apagasse e acendesse duas vezes, até voltar a si mesma e atravessar... enquanto ele indicava vermelho aos pedestres. Rodou no próprio eixo tentando desviar das latas que se locomoviam e ouviu palavras agressivas antes de cair no asfalto quente daquele dia infernal. Foi quando sr Antônio perguntou se ela precisava de ajuda. E ajuda era o que ela mais precisava! Disse a ela que estava já atrasado para o trabalho e por isso não poderia acompanhá-la até em casa, mas caso ela quisesse acompanhá-lo, seria ótimo ter companhia. Lá encontrou não só o companheiro Antônio, mas Johnie Walker e toda a trupe. Afogou-se em goles, arriscou alguns passos de dança, pediu a última dose (daquelas!) e finalmente deixou o corpo perder-se no repouso que tanto clamou. Mas a mente.... a mente nunca pára!

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Eco

A vida parecia um cobertor pesado que, enquanto arrastava-se pelo chão, carregava tudo o que conseguia. Vivia no inferno e sabia bem disso. Sentia o peso do caos todos os dias, quando acordava e quando ía para a cama desmaiar de tanto cansaço. Há tempos não sonhava, talvez porque até para isso estava exausta. Era uma panela de pressão sem válvula de escape. Sentia que tudo ao seu redor fervilhava, ao mesmo tempo em que nada era quente o suficiente para confortar. Objetos frios, pessoas frívolas, olhares congelantes, concreto, concreto, concreto...
Escolheu em meio à bagunça aquele vinil preferido, que parecia aguardar por ela há muito tempo. Levantou a tampa da vitrola e colocou-o para rodar. Olhava para os movimentos circulares do disco, enquanto lá do fundo emergia uma sensação de um torpor angustiante. Ultimamente estava no misto das coisas. Não diferenciava mais nada nitidamente. Tudo era partido ao meio e fundido a outras metades. Sentia como se não fosse mais nada por inteiro. Não alcançava êxtase, não alcançava o gélido... era morna. Morna, sem sal nem açúcar, em cima do muro, entre cá e lá. A vitrola emitia sons que penetravam lá no fundo e pensou como estava deixando as coisas passarem tão longe. Marginalizada de sua própria vida, os olhos não mais dirigiam-se a ela, as bocas, as mãos, os afagos, os tapas... Nada, parecia que não tinha mais nada. Um fantasma perambulando pelo mundo dos vivos. Sabia que não mais vivia, apenas prolongava. E a música continuava a tocar, ecoando pela sala suja, vazia, cheia de nada. Oca. Socorro-socorro-socorro-soco-so...

Suspiro apertado

O sol perdia a nitidez enquanto mais uma lágrima rolava. Pensou que esses eram os momentos em que o frio daquele líquido salgado unia-se ao calor daquele grande círculo em chamas. Em chamas também estava seu corpo, ardendo febre. Correu para debaixo daquele seu cobertor preferido, feito pelas mãos tão cuidadosas da avó. Sentiu tanto quando ela partiu, um nó tão apertado que não deixou que uma lágrima sequer rolasse. E agora eram tantas...
O estômago revirava, num misto de fome e rejeição. Não comera nada durante o dia todo e lembrou dele dizendo que ela precisava se alimentar melhor. Talvez sentisse que já andava fraca, já que a palidez era visível. Invisível era apenas a fraqueza interior. Bastava acordar para sentir que estava prestes a desfalecer. O coração apoiava-se no que podia, mas não aguentaria muito tempo... Lutava para manter-se ao menos batendo. Deixara de sentir havia tempos. Mas sentimentalidades era algo que ninguém mais tinha coragem de cobrar daquele pobre. Era um doente em estado terminal, com bilhete de partida já em mãos. A única coisa que sobrou foi o medo. Mesmo sabendo que a situação nunca mais seria revertida, sentia medo de ir embora. Poderia ser tão de repente, né? E se não desse tempo de se despedir? Ficaria eternizada a sensação de ''algo ficou para trás'', como já estava acostumado. Porém, o caminho estaria fechado dessa vez. Suspirou apertado...

Desabafo

Escreve como quem precisa desabrochar e exalar ao mundo a essência que contém. Boa ou ruim, depende dos julgamentos alheios. Cada qual com o seu, cada qual para si. Para ela era difícil decidir. Sentia como se possuísse nas mãos o mundo todo de possibilidades, ao mesmo tempo em que sabia (sabia?) que era, no fim das contas, somente algumas possibilidades bem sucedidas. Ok, talvez não tão bem sucedidas, mas simplesmente executadas. Constantemente algumas, raramente outras. Estava ali, viva, sendo e existindo como a vida permitia. A vida e ela mesma, pois mesmo que teimasse em lutar contra algumas tantas vezes, sabia que barrava a si mesma logo no princípio de tudo. E depois vinha a sensação de que algo havia ficado perdido lá trás. E angustiava. Lembrou-se da frase que havia lido, algo referente a "tempo morto". Pensou um pouco e ficou em dúvida sobre o que pensar mais. Provavelmente tivera tempos mortos na vida, daqueles bem apáticos, onde nem o vento soa. E então lembrou-se de uma de suas características, talvez até tida como qualidade: a senhora criadora e incentivadora de crises. Não! Não conseguia manter-se em condições diversas sem qualquer adversidade. Precisava daquele gosto amargo da tristeza assim como do gosto tão doce que era estar feliz. Angustiava mas gostava de angustiar. Não aos outros... somente a si mesma. Veneno e cura produzidos por ela, em doses nem sempre homeopáticas, algumas vezes aplicadas em tratamentos de choque. E então a cabeça revirava, um tanto quanto perdida em sono, alucinações, sanidade... Sentia vontade de gritar, sair às ruas, sentir o vento balançar os cabelos e arrepiar a pele. Queria sorrir para as pessoas, fazê-las sentirem-se ao menos notadas num cotidiano onde olhares mal se cruzam e ganharam o hábito de se evitarem. O mundo parece mais escorregadio, envolto em algo que o faz vazar... Socorro, temos um vazamento aqui! Mas definitivamente não é isso o que ela gostaria de gritar. Aliás, bastava dizer ao pé do ouvido, desde que houvesse os olhos... E pensou que nem precisaria dizer nada. Os olhos naturalmente se entenderiam...

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Sumiço...

Muito bem, obrigada.

sábado, 28 de março de 2009

Ordem das coisas

E o fato é que ela nunca agradava ninguém. Talvez fosse a personagem errada em todas as histórias que a vida insistia em lhe colocar. Era mais lógico acreditar assim. Afinal, se o inferno são os outros, não seria fácil descobrir que toda sua rede de convivência é que estava errada. Sim, ela era a errada e pronto. Melhor não discutir. Coisa que, inclusive, ela andava fazendo pouco. Estava aprendendo com maestria como abaixar a cabeça, dizer amém e engolir o alheio. Cansara de dissipar palavras em vão. Só quando percebeu que os cérebros com os quais convivia vinham embalados à vácuo é que tudo fez sentido. O dela com certeza tinha algum defeito. Mais um no meio de tantos outros. Equipara-se ultimamente de uma grande quantidade de máscaras. Não dava para sair às ruas mostrando tantas feridas. Mais fácil espalhar por ai o bom e velho ''tá tudo bem''. Tudo bem? Poucas coisas estavam bem. Até seu coração denunciava isso. E um dia pensou como a vida poderia ser surpreendente caso ela fosse embora sem aviso. Sem bilhete, sem anunciação, um dia simplesmente não acordaria mais. Riu, pensando o quanto tudo era tão vulnerável. Um dia não mais acordaria... E então quis imaginar como ficariam os outros, todos aqueles que insistiram em fazê-la acreditar o quanto era errada. Talvez eles dissessem que até para partir ela tinha pisado na bola, afinal eles sempre crêem que os mais velhos vão primeiro. E chorou.

Despercebida

Depois de sentir como se há séculos revirasse na cama sem conseguir dormir, levantou-se e foi em busca de oxigênio. O ar estava abafado e pesava sobre seus ombros. A cabeça latejava, num misto de cansaço e euforia. Sentia o coração bater forte, pesado, num ritmo lento como quem quase desiste. Foi até a cozinha e bebeu uma dose de qualquer coisa. O gosto amargo da bebida rasgou sua garganta e era como se suas entranhas queimassem. Na tentativa de melhora, cutucava as feridas. Enfiava-lhes as unhas, remexia na dor, sentia tudo à flor da pele. Seu corpo ardia numa violência incontrolável. Seu torpor era tanto que tremia até as extremidades. Comportava frio e calor ao mesmo tempo, sem saber nem ao certo o que sentir. O peso do ar a enjoava. Seu estômago revirava, dava pulos, queria escapar-lhe. Assim como parecia querer escapar-lhe tudo o que era seu. Ou fora um dia. Sentiu-se solitária como nunca havia sentido antes. Gritou e ouviu sua voz ecoar, sem resposta. As pessoas foram embora, não aguentaram o baque. Afinal, ninguém aguentaria alguém que não aguenta a si próprio. Era uma companhia obrigatória que machucava. Também queria livrar-se de si mesma, também queria partir para longe e deixar aquela vida tão machucada para trás. Tinha vontade de começar de novo, em outro lugar, mas parecia presa. Sem saber, prendeu a si mesma nos fios que um dia tentou tecer. Perdeu-se. E a ponta da meada nunca mais apareceu. Sentiu sua carne amolecer e ceder. Caiu com um barulho que com certeza ecoou pelos andares alheios. Será que alguém percebeu? Talvez nem soubessem que ali morava a tal. Despercebida. Acordou no dia seguinte sentindo o ar e sua cabeça ainda mais pesados, mas não ousou levantar-se. Ficou ali para sempre.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Corações milenares

Era um amor daqueles que não precisava ser provado todos os dias para que soubessem que ali estava. Era como algo muito precioso que guardamos no cofre para proteger de qualquer mal, mas que jamais era esquecido, mesmo estando longe dos olhos. Ficava perto de algo muito mais profundo a que chamamos de alma. Era ele lá em cima, expondo o que achava pertinente, enquanto a voz ecoava na alma dela sem que imaginassem quão arraigada ficaria. Cavou fundo, encontrou abrigo e alimento para que sobrevivesse por mais alguns milênios. De alguma forma sentia e sabia que aquele amor já era milenar. Não cabia no tempo presente, era grande demais. Ouvia as palavras ditas com toda a atenção que lhe era possível, ao mesmo tempo em que buscava decifrar as mensagens não ditas. Os olhos exclamavam milhares de coisas que nenhuma palavra era capaz de exprimir. Queriam comunicar algo que somente outros olhos atentos seriam capazes de compreender. Mas que ainda assim, não bastava apenas a atenção. O sentido pleno só seria entendido para duas vidas que um dia se entrelaçaram e nunca mais desfizeram seus nós. E depois de algum tempo guardado, era hora de reabrir o cofre. O momento de saber se apesar de muito tempo tudo se mantinha igual. Será que dessa vez seria assim? Aquele amor de ouro que não oxida continuaria intacto? E que frio na barriga! Hora de acordar todas as partes do corpo que eram tão sensíveis àquela voz e àqueles olhos. Segure o coração, antes que ele resolva sair pela boca. TUM TUM TUM TUM...

segunda-feira, 23 de março de 2009

Gente, que saudade!


Sentiu saudades de gente. Não era uma gente comum, que ela encontraria em qualquer multidão. Era saudade daquela gente que conseguia fazer do seu dia mais pálido um quadro com matizes infinitas, que exalava cores e boas sensações. Sentia como se algo tivesse feito com que todos desaparecessem de uma vez. Só havia restado ela, cuja companhia era ela mesma, com toda a saudade e as sentimentalidades que tinham se otimizado tanto. As proporções aumentaram e tudo era muito mais agora. Os ruídos desconhecidos causavam medo, sem mais o ímpeto curioso de querer descobrir o que eram ou de onde partiam. Sentiu um aperto no peito e pensou que isso só aconteceria se ela estivesse aqui. Ligou o rádio e apurou os ouvidos, numa tentativa de levar o som à alma e quem sabe animá-la para uma pequena dança, quem sabe. Mas lembrou-se de que a música, as danças e os infinitos passos pelo salão só tocariam a alma se ele estivesse aqui. Abriu um livro, leu algo que fez tanto sentido e quis ir além. Queria confabular, dizer o que achou, ouvir impressões, repletas de razão ou não. E então se deu conta de que confabular só era pleno quando ela estava junto, fazendo com que o mundo ficasse pequeno perto de tudo o que ali era dito. Achou melhor dormir e bem tentou acomodar-se na cama. Virou, revirou e percebeu como o corpo dele fazia falta ao lado do seu, cuja completude nunca fora tão clara. Acendeu vários cigarros, um atrás do outro, como que para abafar toda a inquietude que sentia. Mas as tragadas só faziam o peito apertar ainda mais. Que saudade de quando ele me convidava para deixar uma aula qualquer pela metade e sairmos para fumar em algum lugar calmo, onde éramos só nós dois. Até mesmo o computador tinha ficado insuportável. Nunca o sentira tão frio! Atinou para a capacidade dele de tornar a tela mais fria algo morno, aconchegante, que acolhe como um abraço macio. E que saudades do abraço, do colo, do olhar, do cheiro, da pele que encostava na outra, que de tão sensível arrepiava. Tudo remetia a alguém que por razão desconhecida havia desaparecido. Indagava-se como todos puderam fazer isso com ela e chegou a uma conclusão simples: eram humanos. Erravam, acertavam, faziam bem, faziam mal, estragavam ou consertavam qualquer dia de sua vida. Pedia-lhes o mínimo e nem isso obtivera. Mas estavam perdoados, pelo simples fato de serem como ela. Humanos. Afinal, o que é mínimo, qual é o máximo, quais são os limites, quem tem o direito de cobrar? Uma lágrima rolou enquanto ela arrumava as malas para pegar uma estrada qualquer e ir à procura daquela gente. E que saudade!

quarta-feira, 18 de março de 2009

Hello, Bridget!

De verdade, eu não achei que sentiria isso. Atingiu e doeu. Medo, sensação estranha, vontade de pedir que você diga "estava só brincando!" e abrisse um sorriso daqueles que vi nas felizes madrugadas. O lado egoísta implora para que você não saia das mãos. Mas já esteve? Não, a resposta é não. Céus, essa era a última coisa que imaginaria em meu dia. Mesmo que a minha amiga velha de guerra tenha me avisado sutilmente. Bridget, você nunca me abandona. Manda recados antes ou consola depois, mas está sempre presente. Hoje é dia de não conseguir dormir. Estranheza sentimental. Hora de lembrar como o peito pode bater apertado.

domingo, 15 de março de 2009

Um lugar para chamar de seu


Buscava um canto somente seu. Um lugar onde reinasse tudo o que a ela pertencesse, onde as pessoas não entrariam, mas hipoteticamente diriam "é a cara dela". Seria uma extensão de si mesma, já que ultimamente sentia-se tão apertada. Era desconfortável estar somente ali, enclausurada como se estivesse em uma solitária há milênios. Ora úmido demais, ora seco demais. Oscilava sempre, não conseguindo manter seus sentimentos numa constância compreensível. O único ponto eternamente dela era sua falta de amor-próprio. Céus, como era difícil gostar de si mesma. A cada dia descobria mais defeitos que com o passar do tempo tornavam-se insuportáveis. Sentia explosões de tristeza, mas logo resignava-se à sua condição cada vez mais funda. Profunda era, mas de uma profundeza melancólica. Não orgulhava-se de ser um grande poço de emoções amargas, cavado a custa de muitas e muitas feridas. Por um tempo buscou maquiar-se e disfarçar todas elas. Mas cansou-se e resolveu sair do casulo. A cada vôo sentia seu corpo arder-se em brasa. Como as pessoas eram cruéis com quem tanto precisava de ajuda. Os olhares alheios evitavam os seus, mas em encontros desavisados sentia dardos cravando no fundo de sua retina. Após tanta dor prolongada, resolveu trancafiar-se no seu tão sonhado paraíso solitário. Rabiscou um anúncio no jornal, visitou o apartamento e encantou-se com as grandes janelas e a sacada que abrigaria suas noites insones e a fumaça que desprendia-se dos infinitos cigarros. É aqui! E ali foi.

Avalanche


A sensação era como se uma avalanche tivesse principiado a cair. Formou-se em algum lugar com origem desconhecida, com problemas e situações que ela insistia em deixar para depois, mas que mesmo assim eram muito bem conhecidas. Era um erro antigo, que trazia sempre as mesmas consequencias, mas que jamais conseguira consertar. Por ficarem lá, sempre escondidas aos olhares do dia-a-dia, nunca sabia o momento em que aquela grande bola, repleta de seus problemas, desceria sem piedade. Despencava na sua cabeça e quando chegava ao chão, após o baque, por onde quer que se olhasse havia os tais espalhados. E ai se dava conta de quão mais fácil era repará-los assim que apareciam. Postergá-los não significava resolvê-los, já não tinha aprendido? Não, não tinha. E então passava dias onde nada supria e nada trazia as cores de volta. Era um branco frio, de um tom que doía aos olhos. Desprotegida, sem amparo, buscava alguma forma de sumir com tudo aquilo de fato. Lembrou-se que não dava mais para esconder debaixo do tapete. Era necessário encarar seus desejos não concretizados, suas vontades inalcançadas, as pessoas que estavam tão longe, aquelas que desapareceram deixando apenas saudade, a vontade fundida com o medo do novo... Nossa, por onde começar? Enxugou as lágrimas que incessantemente não paravam de cair. Os olhos já inchados clamavam por descanso, a mente já confusa pedia tempo para respirar, o coração já tão apertado dava sinais de que não aguentaria por muito tempo. Das outras vezes, estagnara justamente nesse ponto. Mas falhar novamente em algo que já havia se repetido tantas vezes... Respirou fundo e começou a pegar os cacos que estavam no chão. Recolhia-se. Cada pedaço espalhado era uma parte sua que não havia resistido. Será que era tão fraca assim ou o mundo andava mesmo muito cruel? Lembrou-se de que ninguém havia dito que viver é fácil. Escolheu uma estrada e principiou o caminho inverso. Era hora de reencontrar-se.

sábado, 14 de março de 2009

Bom dia


Fazia tudo numa velocidade frenética, típica de quem vive atribuladamente naquela cidade que se aproxima muito do caos e crê na idéia de que nunca tem tempo para nada, quando a luz elétrica interrompeu o caminho que faria para chegar à sua residência. Era um apartamento pequeno, mas que possuía janelas enormes e uma sacada agradável o suficiente para suas noites de insônia e cigarros. A estagnação dos prótons, elétrons, neutrons e todas aquelas partículas que um dia seu professor de física disse que circulavam por um fio trouxe o espanto comum de uma surpresa. Como poderia dar conta de fazer todas as suas mil e umas tarefas que ainda faltavam? Lembrou-se da música que dizia "o tempo não pára" e foi o suficiente para soltar um "meu Deus", sem se dar conta que há algum tempo não cria mais no divino. Depois de debater-se em pensamentos por um certo tempo, não restou outra alternativa a não ser aproveitar-se da situação. Não foi tarefa muito fácil, pois tirar proveito das coisas que não lhe agradavam nunca foi seu ponto forte. Mas ok, cedeu e foi até o armário da cozinha caçar alguma vela. Já estava escuro e o único resquício de luz era da lua, que resolveu não brilhar muito aquela noite. Com a memória que lhe era pertinente, essa sim um de seus pontos fortíssimos, lembrou-se onde estava o tal cilindro de parafina que a ajudaria evitar alguns roxos pelas pernas. Derreteu o suficiente para fixá-lo no pires, aquele que fora de sua avó e devia ter no mínimo uns 50 anos, e foi sentar-se na sacada. Pensou em ler alguma coisa, mas resolveu deixar que sua vista, já tão cansada apesar da idade, descansasse um pouco. Em meio a penumbra, a chama oscilava levemente com a brisa que percorria sua rua e lhe trazia frescor ao corpo já exausto. Ao mesmo tempo, a mente fervilhava. Era incoerente, mas quanto mais o corpo pedia arrego, mais a mente teimava em ir para longe e cada vez mais longe. Talvez por isso tivesse esse aspecto tão abatido, de quem sempre teve noites mal dormidas e sonhos desesperadores. Seus olhos fixaram o fogo, que ardia sem nitidez. Seus pensamentos visitavam o passado, faziam planos para o futuro, buscava pessoas que há tempos não via e quis tanto tê-los perto, novamente ou pela primeira vez. Fez um pequeno balanço da sua vida e prometeu a si mesma que naquele ano viajaria por algum tempo. O chefe resmungaria um pouco, mas decididamente ela necessitava muito ficar "fora do ar". Sabia que cedo ou tarde sentiria saudades do caos, mas sentia anseio em sentir saudades de sua vida também. Saudades, só lembrava-se de sentir das vidas alheias. Precisava relembrar a falta que a falta faz e perceber que ela também fazia para si mesma. Mergulhada em pessoas, cores, sentimentos, apertos no peito e anseios, saiu do torpor quando percebeu que a luz havia voltado. Mas não era a luz artificial que emanava das lâmpadas elétricas. Era o sol que nascia lá no horizonte, em meio aos prédios, à fumaça que já saía das chaminés das tantas fábricas, com as buzinas tímidas que já ecoavam pela imensidão daquela cidade caótica e que a fez pensar no seu dia que estava por vir, mas leve como há muito tempo não vinha. Sorriu, apagou a vela e foi recomeçar. Bom dia!

quinta-feira, 12 de março de 2009

Acabou

Queria arrancar-lhe as tripas, tragá-lo como um fumante que há dias não encontrava o consolo para seu vício. Você era meu vício, daqueles que estouram o peito a cada ausência. E você era tão ausente. No fim das contas, parecia que convivia mais com a sua imagem holográfica, através de um simulacro, convincente apenas para alguém como eu, que de tanta dor perdeu a noção da realidade. Engolia você sem digerir. Era fome de séculos que eu desejava saciar em milésimos de segundo. Lambia os dedos sem saber que os vestígios que você deixava em mim eram tão prejudiciais. Era como lamber veneno, mas com uma sensação de prazer sem igual e sem tamanho. Infinito. Expandida até o infinito, de onde não se pode mais ver o horizonte. Meu sol já havia se escondido em algum lugar por ai, a lua dessa vez não apareceu. Você era minha única fonte de luz. Luz que confundia e deixava meus olhos deslumbrados. Eu era uma jogadora defronte todas as luzes que as máquinas caça-níquel reluziam. Eu era a viciada em jogo, porém não apostava moedas, dinheiro, casas hipotecadas. Meu coração é que estava ali na mesa, em meio a fichas, baralhos, mãos que íam e vinham muito rapidamente. Pulsava com dificuldade, mas meus rivais não se importavam. Você era um deles, sentado àquela mesa e alternando os olhares entre mim e o órgão pulsante. Sua visão me penetrava tão profundamente, me confundindo, fazendo com que meu estado de delírio fosse cada vez mais intenso e que eu me perdesse cada vez mais de mim mesma, de você, do meu coração, do mundo ao qual eu ainda achava que pertencia. Mas o fio que me ligava a tudo isso se rompeu. Minha corda de segurança cedeu e eu era o lado mais fraco. Despenquei sem conseguir medir a altura do tombo. Sei apenas que demorei a sentir a dureza do chão moendo tudo o que havia restado em mim. Mas creio que não havia restado nada. Depois do baque, só consigo me lembrar de parecer estar sendo sugada por algo que eu não sei o que é. E de repente tudo ficou leve como nunca havia ficado antes. Acabou.

domingo, 8 de março de 2009

É proibido


É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,
Não transformar sonhos em realidade.

É proibido não demonstrar amor
Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.

É proibido deixar os amigos
Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.

É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
Fingir que elas não te importam,
Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.

É proibido não fazer as coisas por si mesmo,
Não crer em Deus e fazer seu destino,
Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.

É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,
Esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus caminhos sedesencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.

É proibido não tentar compreender as pessoas,
Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,
Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.

É proibido não criar sua história,
Deixar de dar graças a Deus por sua vida,
Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.

É proibido não buscar a felicidade,
Não viver sua vida com uma atitude positiva,
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual.

Pablo Neruda

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Pingo pingado

"Sofre com avareza. Também deve ser avara em relação a seus prazeres. Pergunto-me se algumas vezes não deseja se libertar dessa dor monótona, desses resmungos que começam tão logo pára de cantar, se não deseja sofrer muito de uma vez por todas, se afogar no desespero. Mas, de qualquer maneira, não poderia fazê-lo: está atada."

Jean-Paul Sartre, A Náusea

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Sessão da Tarde

Era uma tarde atípica de verão. Em pleno mês de fevereiro, lá estava ela deitada no sofá, com aquela tal coberta de lã já tão cheia de histórias que sua mãe um dia lhe deu. Fazia um frio confortável, daquele que implora por um bom colo, um balde de pipoca e dois pares de meia.
Estava tudo caminhando muito fluido quando leu nas legendas do filme que passava na tv o que ocuparia sua mente por dias seguidos. Falava sobre a morte. E há tanto tempo não pensava sobre ela. Apenas conservara o medo. Era daquelas que acreditava ter muitas coisas para fazer ainda, que era cedo demais para partir, mesmo repleta de sensações paradoxais entre cansar da vida e desejá-la incansavelmente. O nome do filme era algo parecido com "O meu último desejo". Por si só já anunciava o que estaria por vir. Mas bastou algumas três frases para que toda aquela gama de pensamentos sobre morrer e estar vivo aflorasse novamente. Uma personagem dizia que a morte fazia parte da bagagem da vida e que já nascemos com tal bagagem, mas era uma pena que nos afastássemos tanto dessa idéia, ou insistimos em afastá-la de nós, pois assim a morte torna-se algo rodeado de medos e angústias, além de surpreender a todos por ser ''tão de repente". Era claro que a tal é tão natural!
E morrer pareceu óbvio novamente. É como precisar comer, dormir, insistir que o coração bata e o pulmão se encha de ar. Com a diferença que, teoricamente, morrer só se faz uma vez. Teoricamente para os mais céticos, mas ela já não tinha muitas esperanças quanto a isso. Vivia no limiar entre a crença e a indiferença. "Se houver algo além, ótimo. Caso contrário, bom também". E apesar disso, era alguém amedrontada pela morte. Carregava sempre o medo de que o instante seguinte não viesse, com a mania insistente de sempre pensar no adiante, um pouquinho que fosse. Parecia englobar passado, presente e futuro, alternando qual deles era prioridade de acordo com suas tais ''luas''. Talvez temesse a morte por não saber lidar com perdas. Teve algumas pelo caminho, como todo ser humano que um dia acreditou ter algo. Despedir-se era sempre difícil. Fosse para dizer ''até a próxima'' a amigos que não seguiriam o mesmo caminho, fosse para dizer ''adeus'' a quem nunca mais poderia abraçar. Triste não-aprendizado. Sofria muito por isso. Cada ''olá'' trazia a lembrança de que o ''adeus'' viria, cedo ou tarde. E talvez o pior erro fosse não usar tal lembrança para aproveitar, mas lastimar-se pelo tempo tão curto e fugidio.
E qual seria seu último desejo? Pensou vários e não chegou a muitas conclusões. Sabia que ele não seria material. Talvez quisesse não o último, mas mais um dia junto de todas as pessoas que certamente são importantíssimas. Com certeza viajaria muito, mas terminaria seus dias em paz. Não é isso o que dizem? Que descansemos em paz? Pois é. Talvez comece um consórcio de viagens por ai. Nunca se sabe o dia de dizer adeus.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Chuva e lágrimas


Reza a lenda que a chuva deixa as pessoas mais tristes, sensíveis talvez. Quem sabe com ânsia de compartilhar o aspecto molhado, lágrimas caindo incessantemente até que o cansaço chegue. É sentir-se esvair em líquido salgado que escorre pelo rosto sem saber ao certo onde terminará. Talvez encontre a boca, talvez encontre a folha de papel no qual aquelas confissões todas estão sendo feitas. Talvez não encontre ninguém e morra solitária, como aquela que a fez cair.
Ouve os pingos batendo na calha. Lembra-se de seu coração, tão metálico. Após tantas lágrimas, hoje é apenas um pobre enferrujado. Não sente mais batidas, exceto as do líquido que após bater, escorre. O choro é como ácido que corrói o órgão já tão debilitado. Não adianta mais chorar. Mas é um hábito difícil de se desvincilhar. Vai assim, consumindo, pois não descobriu viver de outro jeito. Dor é algo que faz parte do cotidiano como o sol e a lua. Não lembra de ter um dia aprendido a sonhar. A realidade sempre vinha na frente. Abria alas e fechava as portas. A existência era demais, o excesso. Sobrava vida. Para que tanta? Prolongava. Em torpor, ía deixando escorrer, como a água da chuva. Em torpor, como as lágrimas que ainda insistem em cair. Agora. Ouça! (...)


foto: Vitor Moraes (www.flickr.com/vitormoraes)

Sem aplausos


Era a rainha do drama. Sua vida era constantemente uma encenação, repleta de alegrias e tristezas programadas. Tudo era exagerado, mas nada espontâneo. Explodia a qualquer momento, diante de qualquer desculpa. Fosse o estopim ínfimo ou grandioso, deveria ser apenas quando ela quisesse. Às vezes com platéia, conhecidos ou não; outras vezes, somente ele e ela. Até mesmo sozinha não cansava de encenar. Era um hábito do qual não se desvincilhava. No guarda roupa, uma infinidade de máscaras e adereços. Jamais estava de cara limpa. Para comprar pão uma, para ir à festa outra. Preparava-se para os eventos de sua vida. Queria prevê-los todos e assim escolher as vestes que melhor combinavam com a ocasião. As pessoas ao redor ficavam confusas. Não sabiam exatamente se aquela ali, diante deles, era a mesma pessoa que outrora também estivera. "Era tão amável..." O verbo era sempre conjugado em tempo passado. Ela jamais ''é'' alguma coisa, não consegue manter-se constante. Foi milhares, mas nunca plenamente. Assim como as atrizes e seus diversos trabalhos, quando o fim chega é preciso dizer adeus às personagens que um dia foram. Uma parte dela sempre ía embora a cada despedida. Talvez já não houvesse mais nada dela nela. Suas máscaras, suas vestes e suas fantasias sugaram para si o que a pertencia. Eram mais humanas do que a pequena atriz. Não havia mais emoção. Aquele sentimento que vinha lá do fundo do peito, transbordava como um prisioneiro que revê a liberdade, não.. isso não havia mais. Todos os sentimentos eram adestrados e catalogados. Como era fria! E hoje, cada vez mais. Talvez no dia em que todos deveriam chorar sua partida, hão de receber o roteiro da peça que se encerra. Mas não haverá aplausos. E fim!


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Lixo, sem nenhum luxo


A rotina iniciava-se novamente. Era assim: acordava cedo, depois de uma madrugada cheia de pensamentos em turbilhão e escassa de sonos e sonhos, esforçava-se para abrir os olhos, rumava para a cozinha, ingeria qualquer coisa que a mantesse de pé por mais algumas horas, tentava amenizar o mau-hálito com a tal pasta de dente recomendada pelo dentista e lá ía para o trabalho. Inesperadamente, hoje a rotina mudou de cor. O céu estava escuro, anunciando chuva e tempestuosidades. Acendeu o cigarro e percebeu onde estava. Era o lixo. Em meio aos restos, tendo como companhia as moscas que se alimentavam do chorume e que, mais tarde, pousariam nela sem qualquer objeção. Ali, ela era o resto. Não sabia exatamente do que. Talvez de algo bom que cansou, talvez de algo ruim que desistiu. Não havia nome para o que sentia. Nem nojo, nem tristeza, muito menos felicidade. Apática, apenas observava. Encontrou semelhanças entre as moscas e ela mesma. Todas alimentavam-se do que sobrou. Quando os outros não mais queriam, era quando elas começavam a possuir. Nunca se importou com exclusividade mesmo. Muito menos prioridade. Será que em algum momento foi prioridade de algo, alguém ou alguma coisa? Não, não era nem de si mesma. Jamais esteve no primeiro plano. Era apenas figurante no espetáculo que a vida insistia em apresentar. Mas era tão cansativo olhar para os protagonistas de sempre. O sucesso deles é tão frágil. Eram atores que apenas buscam os finais felizes, sem imaginarem a grandiosidade que há em um triste fim. É, a tristeza faz parte da vida. Pena que poucos sabiam disso. Isso era apenas o que ela sabia. Não acreditava em mais nada com tamanha devoção. Era uma devota da tristeza. E afundava-se mais uma vez quando a mosca pousou no que havia restado do seu cigarro. Deu a última tragada e foi mais uma vez usufruir da limpeza que não era sua.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

As Paredes


Aquela música tocou novamente. E como reflexo instantâneo, você surgiu em minha mente na velocidade da luz. E como luz, iluminou. A mente expandiu ao mesmo tempo em que memorava. Planos e lembranças confudiram-se, entrelaçaram-se e meu sorriso se abriu. Em meio a todo aquele movimento, pessoas que mal se olham e tampouco sorriem umas às outras, era o meu sorriso que não conseguia se conter. De repente eu percebi o quanto você está em mim, mesmo estando tão distante. A lembrança do cafuné desengonçado que você fazia trouxe aquela sensação boa, de que o mundo não acabaria naquele instante. Caminhei um longo caminho como se o levasse ao meu lado, segurando pela mão e desejando chegar em casa, para que fôssemos eu, você e as poucas paredes. Teriam também elas lembranças? Imagino quem não as tem. É uma vida com pequenos inícios perdidos entre vários finais. Mas naquele momento eu não tinha fim. Meu corpo era apenas um pequeno pedaço de mim e mal cabia no mundo. Éramos infinitos. Perdia-se a noção do tempo, dias e noites seguiam-se sem que sentíssemos o passar, não havia fome, frio, sede... Havia apenas o que estava ali: eu, você e as poucas paredes. Quando a chuva começou a cair, percebi que havia errado o caminho. Mais uma vez. Suas gotas geladas fizeram com que as memórias se dissipassem e a realidade voltou. Você foi embora. Agora somos apenas eu e as poucas paredes. Geladas, mudas e cegas. Mas talvez o seu branco só reflita o que sou eu. E essa sou eu agora: parede. Olhei no relógio e já estava atrasada, sem saber exatamente para que. Corri, sem olhar para trás.
Parecia tão eterno. Mas era apenas terno.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Família

Aqui, com o coração apertado. Já não sei se é de medo, saudade, apego que sobra ou juízo que falta. É, se eu fosse uma pessoa racionalista, daquelas que coloca o cérebro em primeiro lugar, os sentimentos seriam contidos. Envergonhados, ficariam reclusos, sentindo-se culpados por existirem. Ufa! Que sorte ter me descoberto humana a tempo. A tempo de deixar todos os sentimentos provarem o doce sabor que a vida tem. São como filhos, que por mais amados que sejam, precisam saber como é o mundo. Os filhos e os sentimentos são para o mundo. É, talvez seja assim. Apenas sei que não consegui guardá-los. Meus filhos não serão privados da vida. Corram, descubram, caiam, levantem, riam, chorem... Mesmo sem saberem ao certo para onde ir, sabem para onde podem voltar. Meus caros, dessa vez parece tão óbvio. Sabem que o caminho é aquele, não sabem? Parece tão explícito. Escancarado, sem máscaras, hoje mostrei-me para você. Cortinas abriram-se antes que estivesse devidamente pronta para qualquer encenação. Nua, clara, simples. Assim é. Será que os olhos apertados viram? As luzes ofuscaram o que deveria ser nítido? Peço que desliguem. Chegue mais perto, por favor. Os detalhes serão percebidos pelos detalhes. Sinta... É o coração batendo mais forte. Ouça... a respiração perdeu o compasso. Veja... mas pode fechar os olhos. A luz agora é outra. Sem artificialidades, somos eu, você e nosso brilho. E você brilha tanto!
Acho que meus filhos encontraram um pai...

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Boa sorte

A sua frustração me frusta. Lá no fundo, apesar do medo, há sentimentos doces. Pior do que ver as próprias frustrações, é ver aquelas de quem gostamos. Não, não é amor. Mas também não ficarei procurando nomes para as sensações. É assim, como é. Tenho idéia do que teoricamente deveria ser. Seria mais leve, mais confortável, mais conciliador. Mas não dá. Ou melhor, não deu. Não sei se foi a vida ou se fomos nós, mas alguém quis assim. Ou talvez alguém não quis. Aliás, quisemos e não quisemos muita coisa. Natural. O resultado disso é que não foi o esperado. Nossas vontades incompatíveis e nossos desejos fora de sintonia. Não negamos as vontades, nem os desejos. Apenas não eram agora. Apenas não são agora. Ficam suspensos por enquanto, ou quem sabe para sempre. Só o tempo e a vida dirão. Os porta-vozes das coisas que não são previsíveis. Esperemos. Mas, por enquanto, boa sorte.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Futuro


Causa uma sensação estranha. Impotência, eu diria. Vontade de ser o outro por alguns momentos, para livrá-lo de todo o mal, amém. Não, não é possível. Muito menos saudável. O outro também merece as situações que a vida dá. Melhor fornecer os ombros. Não apenas os ombros, mas as mãos, os olhos, o coração e o que puder. Sou sua. Quem sabe não é melhor que ser você?! Não por questões de inferioridade e grandeza. Não! A questão é outra. O ponto é outro. A chave é sermos eu e você separados. Mas não você aqui e eu lá. Somos eu e você separados, mas ambos aqui, ou quem sabe lá. Somos eu e você separados mas unidos por vontade própria. Ah que bom seria. Ah que bom há de ser. Ah...

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Sabe VONTADE?!

Então...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Promessa

por Cassiano Rodka

Não me prometa nada. Não peço anel, papel ou eternidade. Se amizade já é um tanto, não caia no conto da estabilidade. Não me diga o que ainda não sentes. Nem dê um passo rumo a coisa nenhuma. Quando for hora de jogar os dados, conte nos dedos o número de casas e vá para onde manda o regulamento. Não te convido ao apartamento, pois há mais chaves penduradas. Não receio envolvimento, nem garanto conto de fadas. Não me prometa alegrias ou, até mesmo, fidelidade. Basta passar um vento que logo um momento vira oportunidade. Não me assegure sustento, café na cama ou felicidade. Mas me abrace com vontade, até mesmo em pensamento. Não faça uma promessa sequer, deixe tudo em movimento. E quem sabe traga o tempo um tantinho de verdade.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Talvez agora eu consiga retornar.
Tente, Belazarte.