A pergunta que fica é o que estamos fazendo com as nossas relações? Qual caminho tem tomado a nossa dialética entre interno e externo, entre o mundo e nós mesmos? Para ser sincera, exito alguns momentos antes de dizer que há dialética. Parece que muitas coisas estão sendo empurradas goela abaixo, sem que haja preocupações em refletir e ponderar seja lá o que fôr. Por um momento não há mais troca. São apenas imposições, ação e reação em sentido único, sem permeabilidade. Tudo tem ganho um caráter superficial, epidérmico. Os olhares são inconstantes, os abraços querem cada vez mais rápido se desvincilharem, os beijos não têm mais intimidade, não revelam quase nada exceto desejo físico. A quantidade prevalecendo sobre a qualidade. Os instintos dominando qualquer tentativa de reflexão. Basta atrair para si e ter hormônios. Não é preciso cérebro nem coração. Os sentimentos encruaram. Cada vez mais possuem menos espaço. As pessoas não mais ficam juntas por conseqüência. A lei da atração física é a grande causa. Não é mais necessário que haja laços, afeto, relações estreitas. Ninguém quer se ''amarrar''. A liberdade dos sentimentos tomou outras proporções. Estar com todos ao mesmo tempo e continuar sozinho. Todos são de todos e ninguém é de ninguém. Viva o amor democrático. Mas será que essa celebração está sendo bem feita? Banalizar ou democratizar? Um hiato entre ambas as atitudes. Vivemos na era do fast food. Tudo vem semi-pronto. Basta aquecer através de microondas pelo tempo máximo de 5 minutos. Tudo. Na nova era, conhecer o outro por 5 minutos já é tempo suficiente para escancarar a alma, a boca e as pernas. Nada foi feito para durar mais. Os bens duráveis estão em extinção. O descartável ganha espaço a cada dia. Tratamos tudo como se fosse produtos na prateleira. Em promoção. Estamos saindo da época do ''ficar'' para a fase do ''pegar''. Somos objetos de consumo, diversão simples e facilitada. Prozac não resolve mais. Tratamos a tristeza como algo a ser evitado. Sem nos darmos conta do quanto ela é essencial. A felicidade causa inércia. E sem pensar, vamos brincando de Second Life, criamos protótipos dos nossos sonhos, daquilo que desejaríamos ser. E nos relacionamos assim... Através dos nossos protótipos virtuais amamos, nos apaixonamos, brigamos e assim vamos ''vivendo''. Nossa Matrix está mais forte do que nunca. Entregamos tudo o que tínhamos de pessoal e próximo para bonequinhos genéricos, nos quais colocamos algumas de nossas mais atraentes caractéristicas físicas, que abraçam feito urso, dão tapa na bunda e entregam flores para os seus amigos virtuais. Estamos nos aprisionando sem saber. O interpessoal deu lugar à internet. São cabos e fios que se relacionam por nós. Os olhos e a boca perderam seu espaço para os dedos. Aquilo que não pode ser dito pelas palavras, que exige outras formas de expressão, simplesmente passou a não ser mais exprimido. Ficou o dito pelo não dito. E nisso tudo há um dilema. As nossas gerações estão crescendo nesse meio e não vêem horizontes diferentes por simplesmente não conhecerem. Domingos no parque são programas caretas. Tudo pode ser resolvido via MSN. Até mesmo namoros... Chegamos ao ponto de saber como a pessoa lá do outro lado está somente pela forma como ela escreve naquela caixinha branca. Amizades que surgem através da mesma caixinha. De repente você se vê amigo de alguém que jamais conheceu pessoalmente. E a sensação é tão estranha... Você parece conhecê-lo há milênios, mas só faz alguns meses. O turbilhão de sentimentos confusos. É certo, é errado? Ceder às vontades ou conter os instintos? Ter o direito de se arriscar ou o dever de ser bem sucedido? Eu não acho que há regras. Ser humano só tem graça por ser único. Apenas espero que o amor não vire lenda, feito cabeça de bacalhau e outras coisas mais.
Um comentário:
taê
de hora em hora o último romance informa como anda esse mundinho internético artificial, com seus hiatos entre ambas as atitudes.
é. de imaginar bobagem, mas a hermeticidade se desfaz, grão a grão.
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