segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Ser ou não ser?


Novamente, depois de já algum tempo, o antigo pensamento volta à tona. As surpresas acontecem justamente por não esperarmos que tais situações floresçam novamente. O medo, por sua vez, retorna por justamente não estarmos sempre com a alma preparada para tais exigências que a vida pode trazer. Beleza é sempre um assunto difícil. De fino trato e bom tato. Mais um daqueles conceitos subjetivos que, mesmo sem termos consciência, carrega consigo uma leva de experiências pessoais, influenciando a todo momento o que você acha ou não belo. Aliás, arrisco em dizer que a beleza é algo indissociável de nós mesmos. Sempre acabamos por buscar a beleza nas coisas mais ínfimas. Unindo o útil ao ''agradável'', sabendo que a beleza está nos olhos de quem vê, buscando parâmetros nas figuras apaziguadoras aos olhos...
Até uma certa idade nos preocupamos muito com terceiros. Na verdade, para alguns, essa idade jamais acaba. Mas não é uma preocupação qualquer. É a preocupação de sermos aceitos esteticamente pelo coletivo. É claro que não dá para agradar a todos, mas sendo a maioria, ótimo! Na escola sempre elegemos algumas ''princesas''. As donas dos cabelos mais lindos e bem tratados, do sorriso mais branco e retinho, das unhas mais bem feitas e coloridas com o esmalte da moda, e assim por diante. Tudo aquilo que as denominadas ''modelos'' possuem, elas chegam bem perto. E geralmente divide-se assim: princesas, vassalas e o resto. E é geralmente também nessa divisão que nascem os primeiros traumas estéticos. Se a menininha está 220 gramas acima do peso ideal, medido geralmente por cálculos dos índices de massa corpórea (IMC) vindos na revista Capricho, ela provavelmente já entrou para o time das vassalas. Vai ser obrigada a lavar pratos enquanto a princesa, trajando o vestido mais bonito da festa, agarra o príncipe no baile de formatura. E não importa o quanto a +220gramas seja bacana ou inteligente: a primeira impressão é a que fica. Parece a maldição da beleza. Estética e inteligência formam quase uma dicotomia, daquelas bem maniqueístas. Porém, essa divisão gera controvérsias. Afinal, o que é melhor: ser princesa acéfala ou vassala genial? A imagem que temos quando falamos de uma nerd é quase sempre alguém bem gordinha, com um óculos bem grosso, cabelos desgrenhados, cheios de pontas duplas, unhas roídas e muitos traumas de infância. O problema é que ninguém se atenta a isso até aquela certa idade. A menininha chora todos os dias e ninguém entende. Ninguém lembra que ela é dotada de sentimentos. As pessoas teimam em vê-la como alguém fora dos padrões e ponto. Mas quem fez os padrões? Talvez uma sociedade que vive colocando em patamares mais altos aquilo que pouquíssimos conseguem. Afinal, quantas mulheres no mundo são como as capas de revista? Fica claro que a parcela mais ínfima dela, principalmente quando percebemos que são sempre as mesmas estampadas na capa do mês. E são sempre as mesmas em todos os sentidos. Conversando com um amigo-senior, comentávamos a respeito de revistas de nudez. As femininas mais especificamente. E ele confessou não saber mais diferenciar quais eram aquelas já vistas da última recém lançada. As mulheres aderiram à produção em série. Na verdade, à modificação em série. Afinal, não há cirurgia, seringas e dinheiro que não transforme todas em frangos de padaria. Cintura fina, coxas grossas, sem cabeça, um bronze de Ipanema, iguais, enfileiradas, rodando e rebolando, e inalcançável para qualquer um que não tenha, no mínimo, uma condição abastada. E como conseqüência direta da separação entre beleza e cérebro, somos quase obrigados a escolher um dos lados. Ou nos obrigam a escolhê-lo. Quantas e quantas menininhas bonitas não foram empurradas por suas famílias para qualquer programa de auditório, teste de novela, comercial de fralda, etc? Quantas delas não crescem acreditando fielmente que a beleza pode ser a chave de infinitas portas na vida? Desenvolver o intelecto? Para que? Esquecendo que a beleza estética é apenas um estado de corpo. Está longe de ser eterna. Não vai durar todos os anos de sua vida. A lei da gravidade existe, a flacidez também, assim como tantas outras coisas que o tempo há de mostrar. É possível conciliar beleza e intelectual? Somos obrigados a confessar o preconceito também. Quando uma mulher bonita, daquelas bem bonitas, se mostra inteligente (ou tenta), logo arrumamos algum jeito de impôr a dualidade: OU bonita, OU inteligente. As duas coisas em um só ser parece que não dá.
Mesmo estando a anos-luz de qualquer capa de revista, sempre temi essa disputa. A hipótese de ser lembrada como a menina dos peitos assim ou das pernas assado sempre assustou. Onde ficarão minhas idéias? Em meio as partes do corpo, elas terão espaço? Alguém vai lembrar do que eu falei ou estará muito ocupado me imaginando nua em algum canto da casa? Ok, hipocrisia dizer que beleza não é importante. Mas está longe de ser essencial. Vinícius de Moraes provavelmente está se revirando na cova a uma hora dessas, mas paciência. Estipulemos então outro tipo de beleza. A dos olhos sem plástica, com os contornos do tempo, que fazem lembrar tudo aquilo que já viram; a das mãos cobertas das marcas, que só a idade é capaz de trazer; a da boca sem preenchimentos, capazes de dizer aquilo que o cérebro muito bem talhado é capaz de pensar e criar. Parece clichê, mas há sim uma forma de conciliar beleza e intelecto: que a beleza externa seja mera conseqüência do que acontece aqui, do lado de dentro.

Um comentário:

olavocostela disse...

Sem comentários. Simplesmente excepicional! Leiam e mudem seus conceitos.