segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Lixo, sem nenhum luxo


A rotina iniciava-se novamente. Era assim: acordava cedo, depois de uma madrugada cheia de pensamentos em turbilhão e escassa de sonos e sonhos, esforçava-se para abrir os olhos, rumava para a cozinha, ingeria qualquer coisa que a mantesse de pé por mais algumas horas, tentava amenizar o mau-hálito com a tal pasta de dente recomendada pelo dentista e lá ía para o trabalho. Inesperadamente, hoje a rotina mudou de cor. O céu estava escuro, anunciando chuva e tempestuosidades. Acendeu o cigarro e percebeu onde estava. Era o lixo. Em meio aos restos, tendo como companhia as moscas que se alimentavam do chorume e que, mais tarde, pousariam nela sem qualquer objeção. Ali, ela era o resto. Não sabia exatamente do que. Talvez de algo bom que cansou, talvez de algo ruim que desistiu. Não havia nome para o que sentia. Nem nojo, nem tristeza, muito menos felicidade. Apática, apenas observava. Encontrou semelhanças entre as moscas e ela mesma. Todas alimentavam-se do que sobrou. Quando os outros não mais queriam, era quando elas começavam a possuir. Nunca se importou com exclusividade mesmo. Muito menos prioridade. Será que em algum momento foi prioridade de algo, alguém ou alguma coisa? Não, não era nem de si mesma. Jamais esteve no primeiro plano. Era apenas figurante no espetáculo que a vida insistia em apresentar. Mas era tão cansativo olhar para os protagonistas de sempre. O sucesso deles é tão frágil. Eram atores que apenas buscam os finais felizes, sem imaginarem a grandiosidade que há em um triste fim. É, a tristeza faz parte da vida. Pena que poucos sabiam disso. Isso era apenas o que ela sabia. Não acreditava em mais nada com tamanha devoção. Era uma devota da tristeza. E afundava-se mais uma vez quando a mosca pousou no que havia restado do seu cigarro. Deu a última tragada e foi mais uma vez usufruir da limpeza que não era sua.

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