sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Sessão da Tarde

Era uma tarde atípica de verão. Em pleno mês de fevereiro, lá estava ela deitada no sofá, com aquela tal coberta de lã já tão cheia de histórias que sua mãe um dia lhe deu. Fazia um frio confortável, daquele que implora por um bom colo, um balde de pipoca e dois pares de meia.
Estava tudo caminhando muito fluido quando leu nas legendas do filme que passava na tv o que ocuparia sua mente por dias seguidos. Falava sobre a morte. E há tanto tempo não pensava sobre ela. Apenas conservara o medo. Era daquelas que acreditava ter muitas coisas para fazer ainda, que era cedo demais para partir, mesmo repleta de sensações paradoxais entre cansar da vida e desejá-la incansavelmente. O nome do filme era algo parecido com "O meu último desejo". Por si só já anunciava o que estaria por vir. Mas bastou algumas três frases para que toda aquela gama de pensamentos sobre morrer e estar vivo aflorasse novamente. Uma personagem dizia que a morte fazia parte da bagagem da vida e que já nascemos com tal bagagem, mas era uma pena que nos afastássemos tanto dessa idéia, ou insistimos em afastá-la de nós, pois assim a morte torna-se algo rodeado de medos e angústias, além de surpreender a todos por ser ''tão de repente". Era claro que a tal é tão natural!
E morrer pareceu óbvio novamente. É como precisar comer, dormir, insistir que o coração bata e o pulmão se encha de ar. Com a diferença que, teoricamente, morrer só se faz uma vez. Teoricamente para os mais céticos, mas ela já não tinha muitas esperanças quanto a isso. Vivia no limiar entre a crença e a indiferença. "Se houver algo além, ótimo. Caso contrário, bom também". E apesar disso, era alguém amedrontada pela morte. Carregava sempre o medo de que o instante seguinte não viesse, com a mania insistente de sempre pensar no adiante, um pouquinho que fosse. Parecia englobar passado, presente e futuro, alternando qual deles era prioridade de acordo com suas tais ''luas''. Talvez temesse a morte por não saber lidar com perdas. Teve algumas pelo caminho, como todo ser humano que um dia acreditou ter algo. Despedir-se era sempre difícil. Fosse para dizer ''até a próxima'' a amigos que não seguiriam o mesmo caminho, fosse para dizer ''adeus'' a quem nunca mais poderia abraçar. Triste não-aprendizado. Sofria muito por isso. Cada ''olá'' trazia a lembrança de que o ''adeus'' viria, cedo ou tarde. E talvez o pior erro fosse não usar tal lembrança para aproveitar, mas lastimar-se pelo tempo tão curto e fugidio.
E qual seria seu último desejo? Pensou vários e não chegou a muitas conclusões. Sabia que ele não seria material. Talvez quisesse não o último, mas mais um dia junto de todas as pessoas que certamente são importantíssimas. Com certeza viajaria muito, mas terminaria seus dias em paz. Não é isso o que dizem? Que descansemos em paz? Pois é. Talvez comece um consórcio de viagens por ai. Nunca se sabe o dia de dizer adeus.

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